sexta-feira, 12 de março de 2010

Negociação – arte ou ciência?

Negociação. Eis uma palavra bonita. Todo mundo gosta de negociar. Aliás, negociar todo mundo sabe - ou ao menos pensa que sabe -, afinal, negociar é comprar pelo mínimo e vender pelo máximo possível, não é mesmo? Ou... será que não é bem assim?

O ser humano negocia, sim. Praticamente desde que é um bebê - embora, nessa fase, ainda não tenha a exata noção de que esteja negociando - até o final de sua vida. Negocia-se de tudo, desde o ato de comprar/vender - primeira idéia que nos vem à cabeça, quando pensamos na palavra negociar - até complicados e sutis acordos, cujos componentes nem sempre podem ser claramente identificados, quanto mais explicitados.


O ser humano negocia diariamente e, por vezes, nem se dá muita conta disso.


- negocia o prazo para entregar o relatório que o chefe lhe pediu;
- negocia com seus subordinados para definir um plano para atingir as novas metas de produtividade. - as quais, por sinal, já haviam sido negociadas com a diretoria - e, depois, negocia para definir como e por quem será implantado o tal plano. Ah, sim, e negocia também o prazo e os recursos para o plano.
- negocia com o olhar, quando está paquerando e tentando chamar a atenção daquela pessoa tão interessante que apareceu por ali.
- negocia com a família onde e como serão as próximas férias - isso, é claro, depois de negociar com o chefe se e quando vai tirar férias.
- negocia com o vizinho que, freqüentemente, reclama do barulho que seu filho faz ao ouvir seus discos de rock


Negocia, negocia... e, por vezes, negocia até consigo mesmo, tentando vender determinada idéia para si próprio, coisa que, por vezes, é a mais complicada e difícil dentre todas as negociações.

Pensando bem, negociar é muito mais do que o simples ato de comprar e vender. Na verdade, é preciso, antes de tudo, definir o que é negociar. E, embora isso pareça fácil, talvez não seja assim tão simples. Há muitas definições para negociação e, talvez, elas sejam complementares e não excludentes. Observem algumas delas de autores diversos, a seguir:

- Negociar como conseguir um sim;
- Negociar é usar poder, tempo e informação para conseguir aquilo que se deseja;
- Negociar racionalmente significa tomar as melhores decisões para otimizar seus interesses.
- Negociação é um processo de comunicação interativo, que ocorre quando queremos algo de outra pessoa, ou quando outra pessoa quer algo de nós.

Uma definição mais abrangente para o tema: “negociação é a busca de um acordo entre duas ou mais partes, independentes ou interdependentes, que possuam alguma autonomia de decisão”.

Detalhando os elementos dessa definição, podemos considerar que...

Busca de um acordo: é a tentativa de fazer com que se encontre uma solução que atenda satisfatoriamente aos interesses de todos os envolvidos, ainda que tais interesses não estejam perfeitamente alinhados entre si.

Duas ou mais partes: são os elementos da negociação, pois toda negociação tem, pelo menos, dois lados, mas, freqüentemente, há várias partes envolvidas - isto é, pessoas ou grupos - com seus próprios interesses.

Independentes ou interdependentes: são também as partes envolvidas na negociação, pois, geralmente, todas elas têm um considerável grau de independência entre si, ou seja, nada as obriga a fechar um acordo a qualquer custo.

Alguma autonomia de decisão: significa que cada uma das partes pode decidir individualmente, mas que essa autonomia não é irrestrita, mesmo porque a decisão de uma parte freqüentemente é influenciada pelas decisões dos demais.

Negociar é buscar um acordo. Isto não se discute: chegar ao sim é importante, sem dúvida, mas negociar bem, por vezes, é também a sabedoria de identificar o momento de dizer não. Um erro comum que se comete em negociações é a busca incondicional do acordo, que leva o negociador a aceitar propostas que deveriam ser rejeitadas. Negociar bem, portanto, é não só conseguir um acordo favorável, como também saber identificar e rejeitar acordos desfavoráveis.

Aliás, cabe aqui uma palavra adicional: dependendo do contexto e do meio cultural, a negociação chega a ser quase um lazer. O interminável processo de pechinchar, em certas culturas, está mais ligado a um ritual do que propriamente ao anseio de se conseguir um resultado objetivo. Por exemplo, ao se negociar a compra de um objeto qualquer na famosíssima feira do Djemaa el-Fna, nos finais de tarde em Marrakesh, Marrocos, ou no Grand Bazaar de Istambul, o que se espera de qualquer pessoa é que ela entre no clima e não pague, de imediato, aquilo que o comerciante pede pela mercadoria, pois o processo de sucessivas ofertas e contra-ofertas é parte do próprio passeio. Por outro lado, discutir o preço do Big Mac em qualquer loja da cadeia do McDonald's - até mesmo em Istambul - é pura perda de tempo.

Arte ou ciência?

Muito se tem discutido sobre negociação ser uma arte ou uma ciência.

Howard Raiffa, pioneiro da sistematização do conhecimento sobre negociação, sintetiza a polêmica, no título de seu clássico livro: A arte e a ciência da negociação.

Negociar certamente é algo que exige tanto ciência como arte e, para que isso fique mais claro, convém definir o que vem a ser ciência e o que vem a ser arte.

Ciência é o conhecimento sistematizado, normalmente representado por um conjunto bem estruturado de modelos e técnicas. Por exemplo, o chamado Método de Harvard, é um arcabouço bem elaborado conceitualmente, bem documentado e razoavelmente fácil de se entender e aplicar na prática.

Do lado da ciência está também toda a sistematização de conhecimentos sobre comportamento humano, sobre contextos específicos em negociação, sobre a mecânica e os rituais pelos quais se converge para um acordo e assim por diante.

Arte, por sua vez, é algo bem mais fluido e, conseqüentemente, difícil de definir. Vamos considerar que arte seja aquilo que se aprende e se aprimora na prática. O componente arte é formado por três elementos:

Criatividade - de forma simplificada, pode ser definida como a proposição de novos caminhos, novas soluções, novas idéias.

Sensibilidade - capacidade de entender o outro, de interpretar seus sentimentos, de saber quando ele está confortável ou aborrecido, quando está interessado ou entediado.

Intuição: este é, de longe, o mais difícil de explicar. Entretanto, para efeito de ampliação do sentido dos conceitos de negociação, vamos considerar uma definição simples: intuição é a capacidade de antever reações alheias, ou seja, mais do que simplesmente entender como o outro está se sentindo, significa ter uma idéia mais ou menos clara sobre, por exemplo, como ele reagiria diante de um novo argumento. Obviamente, a intuição tem como pré-requisito a sensibilidade, ou seja, é impossível prever reações, se nem ao menos se entende o outro. Na verdade, a intuição é um raciocínio não-estruturado, que compreende capacidades associativas - transpor experiências passadas para novas situações - e dedutivas - delinear uma conclusão sobre determinado assunto ou evento -, que, em geral, processam-se de forma inconsciente.

O ideal é a visão de negociação como uma combinação entre ciência e arte; ou seja, ao mesmo tempo em que é preciso conhecer os modelos e as técnicas, é imperioso trabalhar também com a parte não estruturada do conhecimento.




Em outro artigo vamos falar um pouco sobre Método de Harvard em negociações.

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