quarta-feira, 25 de junho de 2008

O que é marca?

Por Ricardo Guimarães


Outro dia, fiz essa pergunta a um consultor que tinha acabado de me presentear com seu livro sobre branding e ele me respondeu: "Não defini. É muito complicado definir marca. Achei melhor pular esse capítulo."

Isso é absurdo. É impossível falar de gestão de marca sem definir seu objeto, pelo simples motivo que a definição de marca condiciona a maneira de conduzir sua gestão.

E para você? O que é marca? Eu vou lhe oferecer uma definição, mas antes pense na sua. Com certeza, você tem uma definição. Mesmo que informal e inconscientemente, sempre que se fala em marca, alguma idéia vem à sua mente. Qual é ela? Sabendo qual é a sua, você poderá compará-la à minha, julgar as diferenças e, se for o caso, adotar uma nova definição que o ajudará a definir sua maneira de gerenciar esse ativo.

Vou começar oferecendo a você três definições. Como tudo, nossa definição também muda conforme muda seu contexto.

Num contexto sem concorrentes, típico de mercado primário ou mercado com reserva, dominados por monopólio ou oligopólio, marca é apenas um nome e uma forma gráfica de representação. É apenas isso. É o que o mestre Aurélio define como logomarca: "qualquer representação gráfica padronizada e distintiva utilizada como marca; representação visual de uma marca."

Nesse caso, a gestão da marca é bastante técnica, porque se resume à aplicação correta da identidade visual. A disciplina do design, sem demérito da sua arte, é suficiente para lidar com essa gestão.

Num contexto competitivo, onde se divide o mercado com outras empresas e se disputa a preferência do cliente e do consumidor, não se define marca apenas como uma logomarca. Ela é uma imagem, uma opinião de terceiros sobre a minha oferta. O Mestre Aurélio diz também que marca é "conceito genérico resultante de todas as experiências, impressões, posições e sentimentos que as pessoas apresentam em relação a uma empresa, produto, personalidade, etc.".

Um "marketeiro", provavelmente, daria essa definição. É isso o que ele gerencia: uma imagem, um desejo, uma promessa instalada na mente e no coração do consumidor. Nesse caso, a disciplina do design não é mais suficiente para lidar com o processo. A disciplina capaz de fazer sua gestão é o marketing.

Modernamente, o processo da globalização - leia-se "instalação de poderosa tecnologia de comunicação em redes" - criou um novo contexto, muito mais complexo, veloz e imprevisível que um simples mercado competitivo. Se, nele, algumas técnicas de Porter bastavam para mapear o cenário e fazer previsões, num mercado globalizado não se sabe de onde vem a ameaça, nem de onde vem a ajuda.

A ameaça pode vir de um grande concorrente ou de outro que ainda nem exista, como a Microsoft não existia para a IBM e o Linux não existia para a Microsoft. Ela, a ameaça, pode vir do pricing, da tecnologia, da distribuição, do comportamento das pessoas, de uma questão de política local ou global, enfim, tudo pode ser uma ameaça.

A origem do diferencial competitivo também não é muito clara: pode ser um funcionário que tenha uma idéia que reduza um ciclo ou um custo; pode ser um acionista que aporte capital num momento difícil; pode ser um fornecedor que lhe dê prioridade numa descoberta antes de oferecê-la ao seu concorrente; pode ser um cliente que lhe dê um retorno negativo, permitindo que correções sejam feitas em seu produto ou serviço antes de ele perder mercado; em suma, tudo pode ser diferencial competitivo.

Nesse cenário, marca não é apenas imagem ou promessa na mente do consumidor, mas uma maneira de pensar e agir, que, além de estar na cabeça dele, também está na do funcionário, na do acionista, na do fornecedor, na do cliente, e na de todos que podem, de alguma forma, contribuir para que o ciclo de produção e consumo da marca se sustente e se repita com perfomance cada vez melhor para todos os envolvidos.

Nesse caso, marca é uma cultura. Veja como o Mestre Aurélio nos ajuda na definição de cultura: "(...) modos de sobrevivência, normas de comportamento, crenças, instituições, valores espirituais, criações materiais, etc., (...) patrimônio próprio e distintivo de um grupo ou sociedade específica".

Os centros mais avançados, como a Universidade de Chicago, já identificam a Comunidade da Marca como um fenômeno contemporâneo de organização da sociedade. Nada de errado e nada parecido com o que Naomi Klein chama de marca. Para a querida ativista, marca é um instrumento de massificação, manipulador de corações e mentes, produto de um marketing barato e ultrapassado. Nós sabemos do que ela está falando e não dá para discordar.

No mercado globalizado, definimos marca como uma cultura e uma dinâmica de relações estabelecidas entre empresa/produto e comunidade, que cria valor para todas as partes interessadas.

Outro dia, conversando sobre marca, o Professor Gracioso, da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing), tirou as palavras da minha boca: "Marca é um contrato social!". Eu tinha de concordar. Marca é um contrato que tem seu valor como objeto. Gerenciar esse valor é assunto do branding. Não é por outra razão que a expressão Brand Equity nasceu no mercado de capitais, um universo no qual se fala de atratividade de capital, de talentos e de consumo para se determinar o valor de um papel.

Veja que o conceito foi se ampliando à medida que o mercado foi se complicando e a gestão foi se sofisticando. Você me acompanhou até agora? O que achou? Numa época como esta, de profunda transição e rupturas, é bom começar qualquer conversa pela simples definição das coisas.


Fonte: Portal HSM On-line
10/06/2008

Ricardo Guimarães é presidente da Thymus Branding.


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